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Um pedaço do Senegal em Rio do Sul

Mamadou Abdoulaye Mbodji deixou tudo no Senegal em busca de um futuro melhor para ele e para a sua família.

A vida da maioria das pessoas pode ser resumida em duas escolhas: aceitar as imposições reservadas pelo "destino", ou, escrever a própria história, esquecer as adversidades e deixar tudo para trás em busca de um futuro mais digno. Sem levar em consideração a primeira opção, Mamadou Abdoulaye Mbodji deixou o Senegal e cruzou o Oceano Atlântico na tentativa de uma vida melhor.
Natural da cidade de Louga, a 181 quilômetros da capital Dakar, o senegalês de 34 anos decidiu seguir os passos de um primo que havia se mudado para a Argentina, ele viajou sozinho para a capital e depois de morar um ano com o primo em Buenos Aires, mudou-se para o Brasil com outros dois colegas senegaleses. Um deles ficou no Rio Grande do Sul e o outro subiu até a terra da garoa. Mamadou, novamente sozinho, ficou em Santa Catarina. Ele passou por três cidades antes de chegar a Rio do Sul e está no Brasil há quase três anos.
O continente africano é o segundo maior do mundo e também o segundo mais populoso, mas é o primeiro, no número conflitos permanentes. Dos 54 países do continente, 24 estão em algum conflito armado ou em guerra civil. 

A ESPERA: a foto mais famosa de Kelvin Carter foi feita no Sudão em 1993 e chocou o mundo.


Felizmente Senegal não está nessa situação, entretanto, a vida no país do extremo ocidente africano torna-se difícil pela falta de oportunidades. Não existem muitas vagas de emprego e as disponíveis pagam muito mal. A baixa renda é a maior motivação dos milhares de senegaleses que deixam o país de origem todos os anos. “Senegal é pobre porque não tem petróleo”, explicou Mamadou.
Em louga, Mamadou ganhava a vida como motorista de caminhão, viajava todo o país com cargas de areia, pedras ou cimento. O homem simpático, mas de aparência séria, não é casado e tampouco têm filhos. Antes da viagem, ele, o irmão, e a irmã, viviam com os pais. A idade da mãe, Niama Mbodji, o filho não soube precisar, disse que são 70 e poucos anos, a preocupação maior é mesmo com o pai, Bassirou Mbodji, que já está com 89 anos. “Penso muito na minha família, tenho saudades de todos e me preocupo mais com meu pai que já está bem velho. Quero voltar a vê-lo”, disse o filho. O fato de não ser uma pai de família tornou a decisão de viver no exterior um pouco mais fácil, mas é claro que essa não foi uma escolha que agradou a todos, afinal, a distância sempre parece maior para quem fica. No fim das contas, os pais o apoiaram e hoje, ele luta para conseguir dinheiro suficiente para rever os familiares e os amigos que ficaram na África. Este é um sonho que ele pretende realizar em 2017.
Apesar de a vida ser mais difícil do outro lado do Atlântido, Mamadou Abdoulaye Mbodji não nega as suas origens, ele ama a nação que o criou. A sua intenção sempre foi voltar para o Senegal. Outro desejo era enviar parte do dinheiro conseguido por aqui para a família, mas até o momento isso não foi possível, o custo de vida no Brasil aumentou muito. O que se ganha aqui, fica aqui.

A vida no Brasil

Quando saiu do Senegal, Mamadou não sabia o que a vida lhe reservara. Durante o tempo que ficou na Argentina, sofreu com a intolerância de alguns “hermanos”. “Me tratavam mal por eu ser estrangeiro, por eu não saber falar o idioma e por eu ser negro”, contou o senegalês. O preconceito e a constante desvalorização da moeda argentina fizeram com que ele tentasse a vida no Brasil. Felizmente, desde que chegou, Mamadou diz-se um homem mais feliz. “No Brasil isso nunca aconteceu, é bem melhor que a Argentina”, comentou.
Compreender o português foi complicado no início, agora está bem mais fácil. Mamadou ainda precisa pensar muito antes de falar algumas palavras, mas é capaz de manter uma boa conversa. Mesmo sem nunca ter estudado no Brasil, pode-se dizer que o aprendizado do idioma foi bem rápido. Da mesma forma que aprendeu o português, ele também já havia aprendido francês e espanhol, além do idioma nativo, o wolof. Mesmo não sendo recompensado financeiramente por falar quatro idiomas, o homem de Senegal comemora o fato de estar empregado no Brasil. O salário de aproximadamente R$ 1.200,00 que recebe para cuidar do estoque de uma perfumaria do centro de Rio do Sul, não é suficiente para ajudar a família e tampouco para recomeçar a sua vida no lugar de onde veio. Em contrapartida, a qualidade de vida para ele, melhorou muito. 

TUDO NO LUGAR: Mamadou Abdoulaye Mbodji, conferindo os produtos expostos ao público na loja em que trabalha.
A casa onde mora no Bairro Canoas pertence à dona da loja em que trabalha, ele vive sozinho e o aluguel é uma cortesia da patroa. O restante das despesas fica por conta dele. Apesar de gostar do atual trabalho, o imigrante diz que em breve, pretende trabalhar com aquilo que mais gosta. “Já fiz a minha carteira de motorista e estou esperando ela chegar, eu quero dirigir um caminhão porque é isso que eu sei fazer”, contou mamadou.

A maioria dos amigos também são estrangeiros, alguns haitianos e outros 4 senegaleses que também vivem em Rio do Sul. Mamadou se diz um homem tranqüilo e que não gosta de muito agito, quando se reúne com os amigos prefere fazer um churrasco ou apenas bater um papo, não gosta da maioria das festas da região. “Eu fui umas duas ou três vezes no Mosquito, mas achei mais ou menos. Prefiro festas religiosas”, contou o muçulmano Mamadou. As festas religiosas brasileiras são diferentes do Senegal, e como é difícil encontrar muçulmanos por aqui, ele preserva as suas tradições de maneira solitária.
        Em Rio do Sul, Mamadou não pratica esportes, mas freqüenta uma academia pelo menos cinco vezes por semana. No futebol ele se diz pouco talentoso, no Senegal o seu esporte é o karatê. Por isso ele sonha em conhecer Edemilson dos Santos, o atleta da Capital do Alto Vale é campeão brasileiro na modalidade e se tornou uma referência para Mamadou, após a exibição de uma reportagem produzida pela TV local. Mas o maior sonho do simpático estrangeiro é mesmo conseguir dinheiro, voltar para os braços de sua família e encontrar alguém para amar e começar a sua própria família.

Um pouco sobre o Senegal
  • De acordo com o último censo, o país conta com pouco mais de 14 milhões de habitantes.
  • A capital é Dakar, que concentra 10% da população.
  •  O clima é semi-árido, com temperaturas que nos meses mais quentes podem ultrapassar os 40º Celsius.
  • A religião predominante é o islamismo, seguida por 87% da população.
  • O país foi batizado assim por causa do Rio Senegal.
  • Lá existe uma grande variedade de etnias, O grupo predominante é o wolof, que representa 43% da população.
  • No Senegal existem 18 idiomas, entre eles o wolof, o fulani e o serer, mas o idioma oficial é o francês, devido a colonização do país.
  • Durante as Grandes Navegações o Senegal foi um dos principais lugares de tráfico negreiro por estar em uma localização geográfica privilegiada para os europeus. Muitos dos escravos que vieram para o Brasil eram de lá.
  • A independência do país aconteceu só em 1960.
  • A música senegalesa é conhecida no mundo todo, principalmente na Europa. Entre os músicos locais que conquistaram fama mundial estão Youssou N’Dour e Akon.

O CAMINHO: além do Brasil, Mamadou conheceu outros quatro países até chegar aqui.

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